Brasil

Lula, ao lado de Luis Arce, disse se inicia uma nova fase na relação Brasil-Bolívia que tem relação com uma questão de sobrevivência

Nesta terça-feira, 09, o presidente boliviano Luis Arce, recebeu o presidente boliviano Luis Arce, Luiz Inácio Lula da Silva, para encontro bilateral em Santa Cruz de La Sierra, a capital econômica da Bolívia.

Lula afirmou que os dois países iniciam uma nova era nas relações bilaterais e que a integração da América do Sul não é mais um exercício de retórica, mas uma questão de sobrevivência.

Lula destacou o acesso do Brasil e da Bolívia ao Oceano Pacífico como um dos objetivos da integração. O Pacífico é considerado estratégico para a abertura de novos mercados e para a inserção do continente aos novos fluxos de comércio sob influência da China. A Bolívia perdeu o acesso direto àquele oceano após a chamada Guerra do Pacífico com o Chile, no final do século 19. Lula citou que a integração dos dois países abrirá também as portas do Atlântico para a Bolívia.

“É preciso dar uma chance no século 21 para que o Brasil, a Bolívia e outros países da América do Sul deixem de ser tratados como países em vias de desenvolvimento ou do Terceiro Mundo”, disse Lula, antes de iniciar a leitura do discurso oficial preparado para a ocasião. “Nós temos riquezas que hoje o mundo necessita. Nós temos que oferecer ao mundo alguma coisa que eles não têm”, disse Lula, após fazer referência a fontes renováveis de energia e capacidade de produção de alimentos como diferenciais dos dois países.

Segundo Lula, a integração deve servir “para que a Bolívia possa ir para o Pacífico, possa ir para o Atlântico, para que o Brasil possa ir para o Pacífico”. O Governo Federal, sob Lula, tem o projeto Rotas da Integração Sul-Americana, cujo objetivo é conectar todos os países do continente entre si e com os dois oceanos. Para a concretização do projeto, o fortalecimento do Mercosul é primordial, em sintonia com os debates mantidos na Cúpula do Mercosul, encerrada ontem no Paraguai.

Em sua fala, Lula enfatizou ainda que os dois países têm em comum uma história “entrecortada por golpes” e tentativas de golpe, mas que têm resistido.

Leia íntegra do discurso de Lula

“Quero começar agradecendo ao presidente Arce por me receber neste momento em que as instituições bolivianas mostraram seu valor frente a uma grave ameaça.

Depois de quinze anos desde a última vez em que estive na Bolívia como Presidente, minha vinda simboliza mais que a retomada de uma relação de amizade.

Ela representa também a comunhão de dois países cuja trajetória tem importantes paralelos.

Assim como no Brasil, a democracia boliviana prevaleceu após um longo caminho entrecortado por golpes e ditaduras.

Mas o que julgávamos que era o fim da estrada provou ser ainda um terreno movediço.

Em 2022, o Brasil completou o bicentenário de sua independência num dos momentos mais sombrios da sua história.

Em vez de celebrar, fomos tomados por uma onda de extremismo que desembocou no 8 de janeiro.

O povo boliviano já havia provado desse gosto amargo com o golpe de Estado de 2019 e agora se viu acometido pela tentativa de 26 de junho.

Às vésperas de comemorar o seu bicentenário em 2025, a Bolívia não pode voltar a cair nessa armadilha.

Não podemos tolerar devaneios autoritários e golpismos.

Temos a enorme responsabilidade de defender a democracia contra as tentativas de retrocesso.

Em todo o mundo, a desunião das forças democráticas só tem servido à extrema direita.

Os exemplos recentes na França e do Reino Unido demonstram o imperativo de superar diferenças em prol de um objetivo comum.

Isso também se aplica à integração regional.

Quanto mais sólida for nossa parceria, menor será o apelo dos que pregam divisões.

O bom funcionamento do MERCOSUL, que agora tem a satisfação de acolher a Bolívia como membro pleno, concorre para a prosperidade comum.

Esperamos também poder receber logo e muito rapidamente de volta a Venezuela.

A normalização da vida política venezuelana significa estabilidade para toda a América do Sul.

Por isso, fazemos votos de que as eleições transcorram de forma tranquila e que os resultados sejam reconhecidos por todos.

Bolívia e Brasil estão no coração sul-americano. A integração física e energética da região passa necessariamente por nossos países.

O engajamento boliviano é chave para a conclusão do conjunto de rotas que o Brasil tem chamado de Quadrante Rondon.

Com a construção da ponte binacional sobre o rio Mamoré, o transporte de bens ficará mais barato, beneficiando em particular os estados de Beni e Pando (na Bolívia) e Rondônia e Acre (no Brasil).

As propostas brasileiras para melhorar a navegabilidade no canal Tamengo e no rio Paraguai também visam a facilitar nossa conexão.

A Bolívia segue sendo o principal fornecedor de gás natural do Brasil.

Conversamos sobre a possibilidade de ampliar investimentos nessa área e incrementar o volume exportado para o mercado brasileiro.

O Brasil também importa fertilizantes da Bolívia. Queremos fortalecer essa parceria com a implantação de uma fábrica de nitrogenados entre Corumbá e Puerto Quijarro.

Felicitei a Bolívia pela opção em investir em biocombustíveis e reiterei a disposição do Brasil de compartilhar sua experiência e tecnologia, de modo a contribuir para a transição justa da Bolívia.

No centro dessa transição também estarão os minerais críticos.

A Bolívia tem grandes reservas de lítio, enquanto o Brasil possui terras raras, nióbio, cobalto, entre outros. Há pouco tempo descobriu-se em solo brasileiro o terceiro maior depósito de manganês do planeta.

Como bem descreveu Eduardo Galeano, pelas veias abertas da América Latina correram o ouro de Minas e a prata de Potosí, que enriqueceram outras partes do mundo.

Juntos, podemos nos inserir de forma soberana nas cadeias de valor de recursos estratégicos e evitar que esse histórico de espoliação continue se repetindo no nosso continente.

Além do excelente relacionamento bilateral, Bolívia e Brasil partilham de visões de mundo convergentes, o que nos faz parceiros naturais em diversos temas.

A prioridade conferida à redução das desigualdades e à promoção da segurança alimentar é um deles.

Por isso, fiz questão de convidar a Bolívia a participar da Cúpula do G20 em novembro e a se somar à Aliança Global de Combate à Fome e à Pobreza que será lançada pela presidência brasileira.

O presidente Arce também manifestou o interesse boliviano de ingressar nos BRICS.

A questão da ampliação do grupo continuará a ser discutida na Cúpula de Kazan, na Rússia, em outubro. O Brasil vê como muito positiva a inclusão da Bolívia e de outros países de nossa região.

Compartilhamos com a Bolívia nossa maior fronteira, de 3400 quilômetros, e dois dos nossos mais importantes biomas, a Amazônia e o Pantanal

Infelizmente, a mudança do clima e o crime organizado não respeitam limites.

Disse ao presidente Arce que já temos uma excelente cooperação no âmbito da Organização do Tratado de Cooperação Amazônica e que também podemos trabalhar juntos para combater os incêndios no Pantanal.

Assinamos hoje diversos projetos para fortalecer a capacidade de agentes públicos de combaterem o tráfico de pessoas e de drogas e melhorarem a gestão migratória.

Também iniciamos negociação para viabilizar o acesso de brasileiros à saúde pública na Bolívia, da mesma forma que bolivianos podem utilizar o Sistema Único de Saúde no Brasil.

Conversamos sobre a importância de garantir segurança jurídica a brasileiros na Bolívia, para que eles continuem colaborando com o desenvolvimento econômico deste país.

A Polícia Federal e o Consulado da Bolívia em São Paulo estão trabalhando juntos para regularizar a situação migratória dos milhares de bolivianos que tanto têm contribuído para dinamizar nossa economia e enriquecer nossa cultura.

É esse espírito de intercâmbio e cooperação que pauta a relação ente o Brasil e a Bolívia. Estou certo de que nosso diálogo e amizade crescerão e nos aproximarão cada vez mais.

Muito obrigado.”

( da redação com informações de assessoria. Edição: Política Real)

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